16/02/10

Socialismo, Democracia e Igualdade


Para uma doutrina ligada com as ideias revolucionárias: americana e francesa, o Socialismo “está intimamente relacionado com a Democracia”[1], mas esta relação é ambígua e quando confrontada com a questão da igualdade é objecto de várias interpretação. A antipatia à “democracia” era para muitos críticos uma aversão à “democracia liberal”, e para estes críticos as deficiências das instituições “burguesas” não conseguiam resolver o problema da desigualdade social.
O marxismo por exemplo: “vê no Estado e nas estruturas políticas um instrumento de exploração ao serviço da classe dominante; e mais, a expressão das próprias condições económicas de produção”[2]. A crítica de Marx à democracia da sua época era dupla: primeiro porque “não satisfazia as pretensões da universalidade”[3] já que era discriminatório, na medida em que “supostamente aberto a todos e acessível a poucos privilegiados, adultos proprietários de sexo masculinos”[4]. Marx coloca no plano teórico a concordância entre esta situação e o poder da classe dominante e capitalista. E que um Estado capitalista não fazia outra coisa senão tolerar a sua própria emancipação e que nestas sociedades eram impossível implementar “uma plena generalização das prerrogativas democráticas”[5]. Neste sentido alguns marxistas simplesmente minimizaram a importância da democracia numa perspectiva primária da revolução; enquanto que os socialistas reformistas, rejeitaram esta via, acreditando que os direitos democráticos universais podiam ser alcançados na transformação do capitalismo.
Assim sendo para os socialistas reformistas a questão filosófica que se punha era a evolução gradual de um ordem antiga para uma ordem nova, sem descontinuidade e ruptura abrupta, na opinião de Sidney Webb[6].
O segundo ponto crítico de Marx tinha a ver com a participação política, mesmo que as prerrogativas das democracias liberais continuassem a ser parciais na melhor das hipóteses, o direito da participação política deixava muito a desejar, porque a má distribuição de recursos leva a que os direitos formais percam muito do seu sentido. É a partir daqui que entra em questão a tese da igualdade na democracia.   
Se a democracia moderna não pode resumir só ao acto eleitoral e participação na vida política deve ser mais abrangente e não deve ser um circunscrito a uma classe social — a classe política, porque segundo Gaetano Mosca “a organização da classe política constitui um mecanismo que garante a estabilidade política e não serve somente para o exercício do poder, mas também para a sua manutenção”[7] e para Giddens “a democracia liberal é um sistema representativo e não aceita qualquer forma de participação directa dos governados nos processos de governações”[8].
Tomando todas estas considerações teóricas e paradigmas socialistas, de que não havendo uma participação directa na vida política, a democracia mesmo representativa é deficiente por não conseguir garantir as regalias e os direitos democráticas. E que mesmo numa situação de estabilidade política, a organização da classe política [que detêm o privilégio na participação política] estabelece-se entre o exercício parcial da democracia e a manutenção do poder. O que é observável dentro da realidade política cabo-verdiana, na medida em que os recursos económicos não são distribuídos de forma a proporcionar a obtenção dos recursos políticos, como a participação política, ou seja quem tem maior recurso económico usufrui de maior mecanismo para obtenção de capitais políticos, como por exemplo a informação e o círculo do espaço político. Todavia os socialistas reformistas defendem que o Estado-Providência orientado para a eficaz redistribuição dos recursos económicos favorece o nivelamento político no que diz respeito à participação directa na governação.             


[1] Anthony Giddens, Para Além da Esquerda e da Direita, página 50
[2] Cláudio Alves furtado, Génese e (Re) Produção da Classe Dirigente em Cabo Verde, página 34
[3] Anthony Giddens, Para Além da Esquerda e da Direita, página 50
[4] Idem
[5] Idem
[6] Idem
[7] Cláudio Alves furtado, Génese e (Re) Produção da Classe Dirigente em Cabo Verde, página 38
[8] Anthony Giddens, Para Além da Esquerda e da Direita, página 51

07/02/10

HISTÓRIA DO SOCIALISMO: PEQUENO ENQUADRAMENTO HISTÓRICO NAS ILHAS II

Devido aos antagonismos sociais do século XIX − consequência da Revolução Industrial – os pensadores filosóficos e económicos como Karl Marx e Claude-Henri de Rouvroy – Conde Saint-Simon propuseram paradigmas [fundadores do Comunismo e Socialismo] no cânone da filosofia social com objectivo de resolver os graves problemas [principalmente opuseram-se contra a exploração do Homem pelo Homem] e determinar uma nova ordem social. É importante considerar que na data, a Europa inflamava-se em violentas revoltas por causa da situação de miséria em que viviam os operários – “a primavera dos povos” de 1848 começou em Paris e alastrou por toda a Europa. Por isto para a melhor compreensão do Comunismo e do Socialismo teórico-científico, em contraposição da sua concepção política mais contemporânea – na sua fórmula de Estado; temos que tomar em consideração as condições da sua origem – a exploração económica da burguesia e graves problemas sociais resultantes desta exploração humana.

No encaixe teórico, o que há em comum entre o paradigma Socialista e Comunista é a relevância dada à acção: o Homem é um ser activo capaz de alterar o seu meio social. A noção de que o homem esteve “separado da sua história”[1] impôs ao socialismo a ideia de que são avant-garde da força matriz transformadora no meio social e da natureza. Não seria despropositado considerar que as duas situações mais importantes na história recente de Cabo Verde [Independência e Democracia] verificaram-se porque os seus intervenientes agiram na vanguarda de certas ideias modernas extrínsecas, o que nos força a considerar que o Estado cabo-verdiano actual é duma forte matriz socialista, não negando o teor liberal introduzido na Constituição de 1992. Mas também há que encarar que muitos dos reformistas que opuseram ao regime mono partidário PAIGC/CV, fizeram-no com o propósito de enfraquecer o sistema que se encontrava asfixiado pelo fracasso económico e social[2].

É de observar que as reivindicações: políticas, sociais e culturais, antes e depois destes dois marcos históricos e da transformação do meio social cabo-verdiano, ocorreram devido aos protestos contra a situação de miséria social ou da iminência da fractura social – que segundo Roselma Évora está na origem da abertura política da década de noventa.

Se o conceito de Socialismo remete-nos para uma concepção de nivelamento das classes sociais, é evidente que as práticas políticas não foram direccionaram para este sentido objectivo da acção política. E hoje nos Estados modernos socialistas [os Estados Escandinavos são os expoentes máximos] a política social orienta-se e baseia-se na lógica da Providencia Social – da eliminação dos riscos exteriores que condicionam a realização individual, de acordo um determinado nível de bem-estar e na lógica de redistribuição da riqueza. Estamos pois agora no quadro de definição dum modelo adequado de Estado-Providência para Cabo Verde. Um modelo que não pode pôr em desequilíbrio o desenvolvimento e a redistribuição de riqueza, na medida em que o Estado deve orientar a redistribuição de riqueza e protecção do indivíduo em harmonia com o desenvolvimento do país – para que o Estado não fique sobre pressão e o desenvolvimento seja posto em risco.



[1]Anthony Giddens, Para além da esquerda e da Direita, pagina 45

[2] Roselma Évora, Cabo Verde: A abertura política e a transição para a democracia, pagina 84 a 87